terça-feira, 28 de maio de 2024

TOTALMENTE  DE  ACORDO
. . . . . 
Até porque, em muito casos, não é da liberdade de expressão que se trata, mas sim de crimes de difamação. Como também não é de "discurso de ódio", aberrante bizarria de invenção recente.
Este "discurso" é uma invenção
.
Ninguém sabe exactamente o que é. 
Ou, antes, é o que convém a quem a ele se refere
Quais são os seus termos? Há uma lista? Quem estabeleceu? Com que direito? Como se comunica ao cidadão o que é proibido? 
Deverá estabelecer-se um "Index"? Um Manual de boas maneiras democráticas? Poderia o sistema de prevenção chamar-se
"exame prévio"? 

O "discurso de ódio" é um dos maiores mistérios do presente. 
Não distingue entre opiniões e acções
Falar de alguém sem tom afectuoso ou sem elogios, isso é discurso de ódio? 
Desde quando se deve gostar de toda a gente
Como é possível imaginar alguém que não tenha "ódios de estimação" e não goste de fascistas ou de comunistas, de burgueses ou de sindicalistas, de europeus ou de africanos, de portugueses ou de estrangeiros, de cristãos ou de muçulmanos? 
Se levarmos a sério o "discurso de ódio", as anedotas com alentejanos ou belgas devem ser proibidas. 
De igual modo, as histórias com galegos, judeus, africanos, índios e chineses. Ou "portugas". Termos como "monhé" ou mulato teriam de ser vedados. Nababo e soba têm de ser eliminados. "Les portugais sont toujours gais" deverá ser interdito. "Paciência de chinês" e "avareza de escocês" ou de judeu é ódio. "Fazer judiarias" é termo a merecer cadeia. Tratar alguém por siciliano é condenável. Termos como "mariquinhas" têm de ser abolidos.
Livros têm de ser reescritos: Lusíadas, Cid, Quixote, Sermões, Camilo, Eça, Castro e Aquilino têm de passar à lupa da nova moral.
Esperam-nos tempos sombrios. 
Mesmo sabendo nós que estas modas e estas pressões vão mudando. Para bem e para mal. Quem quiser perceber o carácter móbil da moralidade dos costumes pode entregar-se a vários passatempos. 
Por exemplo, ler os álbuns do Tintim desde os anos 1930 até hoje. 
A maneira como são tratados os negros, os chineses, os russos, as mulheres, os animais, até os portugueses, ilustra bem a evolução de critérios. 
A leitura dos Astérix permite as mesmas conclusões. 
Outro exercício consiste em ler os Pontos nos iii, o António Maria e a Paródia, todos de Bordalo Pinheiro. Pelo que lá diz, o artista estaria hoje à sombra, impedido de publicar. O Mundo ri e a Gaiola aberta já teriam sido condenados. 
O que era ingénuo passou a ser odioso. O que era proibido é agora recomendado ou livre. 
O grande problema é o da definição dos limites. 
Quem define? Com que direito? 
As horas de violência, sexo e palavrões, na televisão, já mudaram muito e evoluem conforme os tempos. Os insultos de hoje não são o que eram há 20 anos. Os nus de hoje não são o que eram há 30. 
Com que direito um grupo de sábios, parlamentares, professores, jornalistas, sacerdotes ou advogados define o que posso exprimir e a que horas posso dizer? 
Todos os dias vemos quem se julgue mestre de moral, titular de direitos sobre as vidas dos outros, imbuído de conhecimentos excepcionais sobre o que é bom ou mau para os cidadãos, convencido de que pode transformar em leis as suas preferências, certo de que as
suas opções são as únicas decentes! 
A superioridade moral dos partidos de esquerda só tem de igual a certeza dogmática dos partidos da direita. 
Os últimos anos têm sido de agravamento deste dilema entre duas formas de despotismo. 
A liberdade de expressão ganha força quando se lhe deve aquilo de que não se gosta. 
Se a liberdade de expressão consiste em pronunciar as frases aceites e os conteúdos admitidos, não há liberdade. 
Temos eventualmente um belo coro, mas liberdade, não. 
A liberdade de expressão não se limita a poder dizer o que nos apetece. Implica ter de ouvir o que não gostamos
A liberdade de expressão não é só construtiva! 
É também destrutiva, crítica e demolidora! A minha liberdade de expressão não termina com a liberdade de expressão do outro. Não! Ela implica a liberdade de expressão do outro, implica que a opinião do outro seja diferente

O confronto entre opiniões, ao abrigo da liberdade de expressão, chama-se discussão. 
A diferença entre opiniões chama-se controvérsia. 
A coexistência chama-se liberdade (António Barreto)
(sublinhados da minha responsabilidade)
António Cabral (AC)

Sem comentários:

Enviar um comentário