1. Considerando a Constituição da República - que os PR juram respeitar quando tomam posse do cargo - e as várias experiências presidenciais ao longo deste 50 anos, em especial a que está em final de mandato, entendo que nas próximas eleições só devo apoiar um candidato que se comprometa explicitamente a respeitar, cumulativamente, as seguintes condições:
- suspender, para todos os efeitos, a filiação partidária que eventualmente tenha;
- assumir-se como Presidente de todos os portugueses, independentemente do seu voto;
- exercer o cargo com discrição e elevação, recusando a banalização e vulgarização da magistratura presidencial;
- respeitar os resultados eleitorais para a AR e a composição desta como única fonte da legitimidade dos governos;
- nunca esquecer que não lhe compete a função de governar, desde logo porque é politicamente irresponsável, a qual cabe ao Governo, responsável perante a AR, nem tampouco o papel de contrapoder, que cabe aos partidos de oposição;
- não se pronunciar publicamente sobre as opções governamentais, nem sobre as posições da oposição, não sendo parte no respetivo debate político;
- não se arrogar o papel de comentador político, muito menos através de pseudoanónimas "fontes de Belém", junto de meios de comunicação seletos;
- manter uma atitude de leal cooperação institucional com o Governo em funções e respeitar (e fazer respeitar) os direitos da oposição, pois nem um nem outra estão sob sua tutela política;
- nunca esquecer que não lhe cabe a função legislativa, pelo que deve exercer o seu poder de veto legislativo a título excecional, especialmente em relação às leis da AR, que é o titular supremo do poder legislativo no sistema constitucional de separação de poderes;
- não comentar publicamente as leis que promulga, pois a promulgação presidencial é uma obrigação constitucional por omissão (salvo veto), que não precisa de ser justificada, como se o PR fosse colegislador;
- recorrer à dissolução parlamentar e à correspondente antecipação de eleições somente como solução de última instância - por se traduzir na interrupção do mandato conferido pelos eleitores -, e nunca por capricho político ou por desforço antigovernamental;
- não instrumentalizar a convocação do Conselho de Estado para se imiscuir em matérias que não são da sua competência;
- respeitar escrupulosamente o princípio constitucional da separação entre o Estado e a religião, não participando, na sua qualidade presidencial, em cerimónias ou eventos religiosos;
- defender sempre os valores constitucionais da dignidade humana, da democracia liberal, do Estado de direito, do Estado social, da descentralização territorial, da integração europeia, da cooperação lusófona, da paz e da segurança coletiva numa ordem internacional sujeita a regras.
Num Estado de direito constitucional, não deve haver lugar para o excesso ou abuso de poder dos titulares de cargos políticos, muito menos por parte do principal magistrado institucional da República.
2. É evidente, para quem acompanha o Causa Nossa, que este desenho da magistratura presidencial está nos antípodas do desempenho do cargo pelo atual PR, Marcelo Rebelo de Sousa, que tenho criticado frequentemente na minha rubrica "O que o Presidente não deve fazer", que já vai no 50º episódio, onde defendi que ele se «arrisca a ficar na nossa história política como um modelo do que não deve ser o mandato presidencial». Na verdade, creio que as próximas eleições devem proporcionar ao País um PR que cumpra escrupulosamente o perfil constitucional de "poder moderador" e de garante do «regular funcionamento das instituições», que exclui todo e qualquer ativismo político presidencial, em competição com a AR e o Governo.
Vital Moreira (VM) é mais um, neste caso um dos ortodoxos convertidos aos belos salões que, LEGITIMAMENTE, se esforça por ir definindo um quadro onde encaixe um candidato a Presidente da República para ele e outros do clube seja aceitável.
Considero, tal como VM, que o actual inquilino em Belém tem prestado um mau serviço à Democracia portuguesa.
Como referi em outros textos, "o inquilino" fez várias coisas bem (opinião pessoal naturalmente) como aproximar as pessoas à política e aos órgãos de soberania, às instituições, fez-se próximo dos cidadãos comuns.
Mas (opinião pessoal, naturalmente) abandalhou o cargo, apalhaçou-o, sendo que, roubar batatas fritas do prato de uma pessoa, ou andar uns minutos com a máquina de calcetar, ou as tristes figuras bem apontadas por Ricardo Araújo Pereira na SIC, são tristes e lamentáveis exemplos da completa falta de elevação no desempenho das funções de Presidente da República. Mas sempre feliz.
Já não me recordo se Marcelo anunciou aquele "pro forma" de entregar o cartão de militante (que suponho é) do PSD; embora, como Soares eloquentemente sempre demonstrou, isso vale quase nada ou nada, pois foi presidente de todos os portugueses mas, sobretudo (opinião pessoal naturalmente) dos militantes e simpatizantes do PS, pois para esses tudo, para os dos outros partidos NADA, e a quem sobrasse que se aplicasse a lei!
É público e notório que Marcelo desempenha as funções do cargo com cada vez menor discrição e elevação. Mas sempre feliz.
Quanto à separação de poderes, têm sido inúmeras as vezes em que Marcelo finge não saber que não governa, que não tem poderes executivos, que nem legisla. Mas sempre feliz.
Tem sido recorrente em Marcelo, pronunciar-se publicamente sobre opções governamentais, e persiste em ser aquilo que durante décadas foi nas TV, comentador político. Lamentável. Mas sempre feliz.
Tem sido a norma, Marcelo tem actuado como se não existisse Tribunal Constitucional. Mas sempre feliz.
Não é demonstrável em Tribunal, mas tem sido evidente (opinião pessoal naturalmente) que às suas acções directas, muitas delas lastimáveis, tem acrescentado a acção indirecta, dissimulada, através de "fontes", muitas das quais se percebe perfeitamente quem são, e a mando de quem actuam. Mas sempre feliz.
Não se conforma com o facto de que não é legislador.
Entretém-se constantemente a comentar publicamente as leis que promulga, finge não conhecer o que a CRP estipula quanto ao processo legislativo, que tem de terminar com a promulgação do PR excepto em vetos, e a posterior e final referenda do governo. Mas sempre feliz.
Ficará para a história como o maior "dissolvente" de Assembleias. Mas sempre feliz.
As sucessivas convocações do Conselho de Estado (CE) a que acresce certos convites de personalidades estrangeiras para assistir aos CE, demonstraram cabalmente que instrumentalizou esse órgão para seu belo prazer, extravasando (opinião pessoal naturalmente) as suas competências constitucionais. Mas sempre feliz.
Tenho sérias dúvidas que tenha tido até ao presente uma actuação discreta, prudente, quanto à fé, esquecendo que uma coisa é ser católico, e outra diferente que define a CRP, separação do estado e igreja. Mas sempre feliz.
Enfim, Marcelo tem desempenhado as funções do cargo divertindo-se (opinião pessoal naturalmente). Mas sempre feliz.
Não se pode dizer, creio, que não tem seguido aquilo que jurou - Juro por minha honra desempenhar fielmente as funções em que fico investido e defender, cumprir e fazer cumprir a Constituição da República Portuguesa. Tem dias, mas sempre feliz.
Em síntese, concordo em várias coisas com VM.
Adicionalmente, o interessante para mim, naturalmente, é verificar a falta de memória deste ex-Constituinte quanto ao passado.
Enfim.
AC
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