Depressa e bem não há quem
Manuel Cabral de Sousa, estudante de Direito, 21 fev. 2024
Manuel Cabral de Sousa, estudante de Direito, 21 fev. 2024
Os debates eleitorais entre os líderes dos partidos candidatos à Assembleia da República têm evidenciado deficiências estruturais que em nada contribuem para um voto consciente.
No ano em que se celebram 50 anos do 25 de Abril e de experiência, assimilada em inúmeras campanhas eleitorais, seria expectável que se notasse um significativo acréscimo de qualidade pelo menos ao nível da organização dos debates. Contudo, considero que tal não aconteceu de forma considerável, especialmente com este “novo” modelo de debates, devendo o mesmo ser abandonado ou, no mínimo, repensado
Em primeiro lugar, partindo do aspecto mais básico, o problema surge, desde logo, com a duração definida para os debates. Os vinte e cinco minutos primeiramente estipulados para a realização de um debate eleitoral são manifestamente insuficientes para esclarecer o eleitorado sobre as grandes medidas que cada partido propõe levar a cabo.
Deste modo, abre-se caminho à demagogia, à discussão pouco concreta, a propostas irreais, à não clarificação de ideias, a acusações e interrupções, a jogos políticos, entre outras questões que não dignificam este espaço (já para não falar de temas completamente alheios ao debate e que também acabam por ser discutidos).
A solução passaria, logicamente, pelo aumento da duração dos debates (o que já tem vindo a acontecer progressivamente), mas também pela aposta em debates específicos sobre os temas mais estruturantes, preferencialmente com mais do que dois partidos representados (densificando o tema em discussão e permitindo ao eleitor ter uma melhor visão comparativa). Discordo totalmente da ideia de que os debates mais curtos são mais “consumíveis” e mais eficientes na transmissão de propostas para o eleitorado. Acredito mesmo que seria mais proveitoso ter uma sequência de debates temáticos, entre todos os partidos e durante um período de tempo bastante superior ao que temos presenciado, do que os “combates” a que temos assistido.
Em segundo lugar, existe uma abordagem pobre em relação aos programas eleitorais e à estrutura de cada partido. Além dos já falados casos de partidos que no dia 5 de fevereiro ainda não tinham programas apresentados, o que considero completamente irrazoável, entendo que não há um escrutínio mediático suficiente sobre eles. Atendendo a que o tempo de debate é escasso, devia haver maior pressão sobre este instrumento, que é pouco divulgado e escrutinado de forma bastante superficial. Na minha opinião, não chega ao cidadão comum, de forma clara, o essencial do que cada partido promete e como o irá concretizar (ainda que os meios à disposição para tal sejam cada vez mais abundantes).
Para além desta necessidade de maior desafio ao que cada partido anuncia no seu programa, penso que também se devia apostar num exercício de comparação e difusão prévia dos diferentes programas dos partidos, anteriormente aos debates, de modo a tornar a discussão frente a frente mais concreta, idealmente passando por uma clarificação objetiva.
Quanto à estrutura de cada partido, os nomes constantes das listas devem ser publicitados e escrutinados, de maneira que os eleitores conheçam mais detalhadamente quem compõe as listas de cada distrito (e não só quem as encabeça) e que, ultimamente, os poderão representar.
Em terceiro lugar, acredito que a moderação tem sido ineficaz na condução dos debates, dando aso a divergências na alocação dos tempos, à permissão de interrupções sucessivas, acusações infundadas, permitindo divagações e deixando passar muitas vezes em branco ideias por clarificar e propostas por explicar.
Sou apologista de uma moderação mais rígida, tanto na estrutura do debate como na respetiva condução, preferencialmente menos flexível. Não se pode permitir que os debates continuem a ter os problemas que enunciei anteriormente. Principalmente, deve haver um esforço sério para forçar a explicação concreta de propostas dúbias, não as deixando por clarificar.
Deixo também uma nota elogiosa para o fact checking, que tem sido essencial para o escrutínio do discurso de cada candidato. É certamente alarmante a quantidade de imprecisões e mentiras proferidas pelos participantes ao longo da campanha, mas seria inegavelmente mais danoso se tal não se apurasse.
Outra questão importante diz respeito aos “partidos pequenos”, ou seja, aos partidos sem assento parlamentar. Há um certo abandono destes partidos com o qual, de certa forma, nos conformámos todos. Seja por razões mais ou menos justificáveis, a meu ver, esta rejeição cria uma barreira para que novos projetos políticos prosperem minimamente (sendo que há sempre espaço para eles, especialmente atendendo ao facto de que existem posições políticas por explorar em Portugal). Bem sei que existe o famoso “debate dos partidos pequenos”, mas este não constitui uma integração real destes partidos, mais parecendo um freak show do que uma porta para a ascensão dos mesmos.
Finalizando o tema, tenho presente a realidade do quão maçador pode ser o “consumo” de material e propaganda política, sobretudo para quem não procura, convive ou tem tempo para este mundo. Ainda assim, é claro que o caminho não pode ser este e estruturalmente existem meios mais dinâmicos, completos e eficientes que ajudam a cumprir os fins a que os debates se propõem.
No ano em que se celebram 50 anos do 25 de Abril e de experiência, assimilada em inúmeras campanhas eleitorais, seria expectável que se notasse um significativo acréscimo de qualidade pelo menos ao nível da organização dos debates. Contudo, considero que tal não aconteceu de forma considerável, especialmente com este “novo” modelo de debates, devendo o mesmo ser abandonado ou, no mínimo, repensado
Em primeiro lugar, partindo do aspecto mais básico, o problema surge, desde logo, com a duração definida para os debates. Os vinte e cinco minutos primeiramente estipulados para a realização de um debate eleitoral são manifestamente insuficientes para esclarecer o eleitorado sobre as grandes medidas que cada partido propõe levar a cabo.
Deste modo, abre-se caminho à demagogia, à discussão pouco concreta, a propostas irreais, à não clarificação de ideias, a acusações e interrupções, a jogos políticos, entre outras questões que não dignificam este espaço (já para não falar de temas completamente alheios ao debate e que também acabam por ser discutidos).
A solução passaria, logicamente, pelo aumento da duração dos debates (o que já tem vindo a acontecer progressivamente), mas também pela aposta em debates específicos sobre os temas mais estruturantes, preferencialmente com mais do que dois partidos representados (densificando o tema em discussão e permitindo ao eleitor ter uma melhor visão comparativa). Discordo totalmente da ideia de que os debates mais curtos são mais “consumíveis” e mais eficientes na transmissão de propostas para o eleitorado. Acredito mesmo que seria mais proveitoso ter uma sequência de debates temáticos, entre todos os partidos e durante um período de tempo bastante superior ao que temos presenciado, do que os “combates” a que temos assistido.
Em segundo lugar, existe uma abordagem pobre em relação aos programas eleitorais e à estrutura de cada partido. Além dos já falados casos de partidos que no dia 5 de fevereiro ainda não tinham programas apresentados, o que considero completamente irrazoável, entendo que não há um escrutínio mediático suficiente sobre eles. Atendendo a que o tempo de debate é escasso, devia haver maior pressão sobre este instrumento, que é pouco divulgado e escrutinado de forma bastante superficial. Na minha opinião, não chega ao cidadão comum, de forma clara, o essencial do que cada partido promete e como o irá concretizar (ainda que os meios à disposição para tal sejam cada vez mais abundantes).
Para além desta necessidade de maior desafio ao que cada partido anuncia no seu programa, penso que também se devia apostar num exercício de comparação e difusão prévia dos diferentes programas dos partidos, anteriormente aos debates, de modo a tornar a discussão frente a frente mais concreta, idealmente passando por uma clarificação objetiva.
Quanto à estrutura de cada partido, os nomes constantes das listas devem ser publicitados e escrutinados, de maneira que os eleitores conheçam mais detalhadamente quem compõe as listas de cada distrito (e não só quem as encabeça) e que, ultimamente, os poderão representar.
Em terceiro lugar, acredito que a moderação tem sido ineficaz na condução dos debates, dando aso a divergências na alocação dos tempos, à permissão de interrupções sucessivas, acusações infundadas, permitindo divagações e deixando passar muitas vezes em branco ideias por clarificar e propostas por explicar.
Sou apologista de uma moderação mais rígida, tanto na estrutura do debate como na respetiva condução, preferencialmente menos flexível. Não se pode permitir que os debates continuem a ter os problemas que enunciei anteriormente. Principalmente, deve haver um esforço sério para forçar a explicação concreta de propostas dúbias, não as deixando por clarificar.
Deixo também uma nota elogiosa para o fact checking, que tem sido essencial para o escrutínio do discurso de cada candidato. É certamente alarmante a quantidade de imprecisões e mentiras proferidas pelos participantes ao longo da campanha, mas seria inegavelmente mais danoso se tal não se apurasse.
Outra questão importante diz respeito aos “partidos pequenos”, ou seja, aos partidos sem assento parlamentar. Há um certo abandono destes partidos com o qual, de certa forma, nos conformámos todos. Seja por razões mais ou menos justificáveis, a meu ver, esta rejeição cria uma barreira para que novos projetos políticos prosperem minimamente (sendo que há sempre espaço para eles, especialmente atendendo ao facto de que existem posições políticas por explorar em Portugal). Bem sei que existe o famoso “debate dos partidos pequenos”, mas este não constitui uma integração real destes partidos, mais parecendo um freak show do que uma porta para a ascensão dos mesmos.
Finalizando o tema, tenho presente a realidade do quão maçador pode ser o “consumo” de material e propaganda política, sobretudo para quem não procura, convive ou tem tempo para este mundo. Ainda assim, é claro que o caminho não pode ser este e estruturalmente existem meios mais dinâmicos, completos e eficientes que ajudam a cumprir os fins a que os debates se propõem.
==============================================
Há neste texto uma enumeração de aspectos muito reais, sérios, a merecer profunda reflexão no âmbito dos poderes, no âmbito da comunicação social, no âmbito do nosso sistema político, e que na minha opinião naturalmente, a sua persistência muito contribuem negativamente para o crescente desinteresse de uma grande parte dos concidadãos pela política e pela organização/ vida colectiva.
A nossa Constituição bem define "Portugal como República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária". (Art 1º)
Adicionalmente, e no âmbito das tarefas fundamentais do Estado, consagra "o garantir os direitos e liberdades fundamentais e o respeito pelos princípios do Estado de Direito Democrático", (alínea b, Art 9º) bem como, "defender a democracia política, assegurar e incentivar a participação democrática dos cidadãos na resolução dos problemas nacionais". (alínea c, Art 9º)
Não menos importante, "Todos os cidadãos têm o direito de ser esclarecidos objectivamente sobre actos do Estado e demais entidades públicas e de ser informados pelo governo e outras autoridades acerca da gestão dos assuntos públicos". (nº2, Art 48º)
A não correção dos aspectos apontados no texto supra ajudará ao desinteresse, ao alheamento, de grande parte dos cidadãos.
Ausência de confrontos de programas, não esclarecimento de muitas propostas e promessas, demagogia crescente cada vez mais "oleada" com mentiras descaradas, contribuirão para a degradação política, para a não participação, para a abstenção.
Exactamente o contrário do estatuído na Constituição.
Lamentável, opinião pessoal naturalmente, em muitos aspectos a Constituição tem evoluído para parcial Constituição semântica pois o regime real está distante de parte do seu normativo, são os directórios partidários que têm concentrado o poder real.
Particularmente os sublinhados, da minha responsabilidade, reflectem a minha concordância com as lúcidas reflexões e as inquietações subjacentes ao texto deste jovem concidadão, estudante de Direito.
António Cabral (AC)
Sem comentários:
Enviar um comentário