terça-feira, 29 de maio de 2018

DIGNIDADE
Na vida, ao nascer, ao longo e no fim do nosso ciclo aqui no planeta, e na morte. DIGNIDADE.
Dignidade, uma qualidade moral, um modo digno de proceder.
Eu pouco vejo televisão e, mesmo que quisesse, hoje foi-me impossível. Enquanto esperava pelo pedreiro e pelo electricista, ouvi pelo rádio do carro estacionado de porta aberta junto à garagem, alguns trechos dos debates na AR acerca das propostas do PS, PAN, Verdes (por fora, vermelhos por dentro) e BE.
Vou jantar, e sei agora que os quatro projectos foram chumbados, sendo que o do PS esteve menos longe de conseguir aprovação.
Marcelo deve ter mandado vir uma garrafa de champanhe. Não espumante, champanhe mesmo!
Eutanásia, morte assistida.
Parece que há imensa gente cheia de certezas pró e contra a eutanásia. Eu nunca pensei muito nestas coisas mas já pensei alguma coisa e, contrariamente a muitos dos meus concidadãos sejam pró ou contra, eu estou cheio de dúvidas.
O ter feito 70 anos, ser portanto um septuagenário, já me fez pensar em aspectos da vida que décadas atrás não coloquei nas minhas preocupações. E repito, estou cheio de dúvidas.

Que factos me ocorrem acerca deste assunto?
- posso estar distraído, mas penso que nem o BE colocou no seu programa eleitoral para as legislativas passadas a questão eutanásia; se é legítimo qualquer partido a qualquer momento levantar uma determinada questão na AR, penso que há um valor que devia ser tido em conta, a autoridade e, já agora, a respeitabilidade. Atentar no que se falou antes das eleições.
- assalta-me a ideia de que, nas negociatas entre BE e PS para constituir a geringonça, esta questão estará lá.
- posso estar equivocado, mas o BE teme que na próxima legislatura seja igualmente ou mais complicado tentar aprovar isto; tentaram agora.
- o assunto divide muito a sociedade portuguesa, acredito nisto; divide mesmo alguns partidos, se calhar mais do que possa sugerir as votações do PS e do PSD.
- se percebi bem do que fui lendo no IPAD enquanto esperava pelos "técnicos", a igreja católica perdeu várias oportunidades para ser prudente neste assunto. O Óscar da tonteria pode ser facilmente atribuído ao Bispo de Évora.
Rui Rio teve um comportamento escorreito; recomendou liberdade de voto e assumiu claramente a sua posição no assunto, não se preocupando e BEM, se essa sua posição lhe trará mais inimigos internos e externos. Foi limpo, claro, sem demagogias. Concorde-se com ele ou não, tomou uma posição de honestidade intelectual, sem joguinhos.

Sobre o assunto, reafirmo que estou cheio de dúvidas. Isto é coisa para debate prolongado na sociedade. PROLONGADO.
Mas tenho uma certeza, baseada na experiência que directamente conheci e vivi.
O Estado e concretamente os governos que o materializam em parte, não asseguram dignidade ás pessoas no final da vida.
Cuidados de saúde? Chamem-lhe o que quiserem, paliativos, etc. Mas modo digno de proceder, a sério, é coisa que da parte dos governos continua a estar ausente na prática política.

Casos que vivi/ vivo, DIRECTAMENTE:
- derrame cerebral, interno, agudo, na sequência de queda, ao ponto de ter sido feita trepanação (penso ser o termo) ou seja furar o osso na cabeça para extração de sangue e assim aliviar a pressão em zonas do cérebro; vegetal, irreversível, e assim ficou dias, roncando. Dignidade? Alguma, numa cama nos cuidados intensivos. Tinha 83 anos. Devia ter sido morto?
- supomos, cancro generalizado que o foi corroendo ao longo de 4 anos sem nunca ter havido um diagnóstico rigoroso; 84 anos; tinha ainda uma ligeiríssima lucidez, faleceu em casa, sossegado, durante uma noite, sem ninguém dar por isso a não ser no início da manhã. Devia ter sido morto antes?
- numa cadeira de rodas, quase a não conhecer ninguém, a pouca distância de vegetal vivo; bem tratada, com visitas semanais de vários. Quase 90. Devia ser morta?

As questões da saúde são determinantes na qualidade de vida das pessoas. A saúde é o melhor euromilhões que se pode ter. Mas o fim da vida a todos chega.
Pensar nisto, com dignidade, sem preconceitos, respeitando as opiniões todas. 
Mas para haver respeito também importa que não fiquem quaisquer dúvidas sobre os propósitos de alguns dos Pró e de alguns do Contra. E eu estou cheio de dúvidas sobre esta questão da vida, como tenho muitas dúvidas sobre certos propósitos.
António Cabral (AC)

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