sexta-feira, 31 de dezembro de 2021

COMUNICAÇÃO  SOCIAL  ACRÍTICA

ACRÍTICO - que não critica, que não analisa com rigor e profundidade. 

Digo-o, defendo-o, há muito tempo, defendi-o em conversas na vida profissional, na família e com amigos e conhecidos. Escrevo-o aqui no blogue desde há muito.

E o que digo? Que não haverá, NUNCA, uma democracia madura, saudável, um Estado de direito, sem comunicação social livre e independente, uma comunicação social que informe com rigor, factual, uma comunicação social que a par tenha espaços/ colunas de opinião. Uma comunicação social não enfeudada aos poderes públicos.

Uma comunicação social onde se suspeita que o Presidente da República tem canais directos para espalhar o que lhe interessa, onde se suspeita que o governo tem nas suas mãos e bem seguros os cordelinhos de várias marionetes, uma comunicação social em que se observa a transferência periódica, calculada, de determinados elementos de agências para outros meios de informação, uma comunicação social em que o escrutínio é o que se observa, uma comunicação social assim talvez não esteja num estado de saúde muito saudável.

Alguns casos. 

Aqui há tempos o "governo geringôncido não formal" espalhou milhões de euros pela comunicação social. TODOS os OCS? Claro que não. Chamaram-lhe apoios concedidos pelo Estado à área da comunicação social. E o governo atribuiu às Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional, nas respectivas áreas geográficas de actuação, as competências nos regimes de incentivo à leitura de publicações periódicas e de incentivos do Estado à comunicação social. Dizem sempre "Estado" que é para não referir que é o governo. O Estado tem costas largas.

Quem recebeu e o quê? Um balúrdio de dinheiro em grande parte na forma de compra de publicidade, disseram. E disseram que era uma medida excepcional e temporária. O que é certo, segundo se leu em 2020 (resolução do Conselho de Ministro de 19 Maio) é  que os donos da SIC e Expresso e TVI e companhia limitada foram os grandes mamões. Mas também receberam, Cofina, Global Media, Público, Trust in News, Megafin, Newsplex etc. Com esta distribuição é legítimo concluir-se o que se quiser, particularmente tendo presente como são noticiadas certas coisas e como, em relação a certos temas e broncas, se passa de raspão.

Olhe-se ao Serviço Nacional de Saúde (SNS) e os diferentes e diversos problemas que são noticiados. Faltam médicos em todo o lado, diz-se. Faltam enfermeiros também em todo o lado. Eu que tenho a mãe num lar verifico o que se passa. Olha-se ao que se passa no hospital de Santa Maria (por exemplo os concursos para medicina interna) e ficamos a pensar. Certamente por inépcia minha apenas encontrei um mapa de recursos humanos deste hospital com elementos de DEZ 2010 a DEZ 2013. 

Que investigação fazem os OCS para lá de noticiarem faltam, faltam, faltam? Porque, ou há incompetência do ministério da saúde, ou das administrações hospitalares, e os mapas estão desactualizados. E, claro, decisivo, a montante, o problema de estatutos da profissão, das profissões, das carreiras, dos vencimentos muito abaixo do que os privados pagam. Além disso, os equipamentos (ou falta deles) e as instalações em muitas unidades de saúde.........

Olhe-se a assuntos militares. Não, não quero perder tempo com a escandalosa substituição do Chefe do Estado-Maior da Armada, telenovela que começou a ser engendrada um pouco antes da pandemia ter explodido. Engendrada por quem se sabe. Mas, a comunicação social passa o tempo a periodicamente divulgar coisas relacionadas com a instituição militar. Por exemplo, acaba de ser divulgada uma decisão aprovada em conselho de ministros relativa a efectivos, o montante global de efectivos para a instituição militar, para 2022 a 2024. E escrevem que esta aprovação é já reflexo das alterações que deram poderes vastos ao chefe do estado-maior general das Forças Armadas (CEMGFA). Alguém se preocupa em investigar a relação concreta disto com o CEMGFA? Alguém se pergunta e resolve estudar o assunto, que dimensão devem as Forças Armadas ter? 

Em 11 de Dezembro passado, com uma fotografia do sorridente CEMGFA, o Expresso publicou uma notícia referindo que Marinha, Exército e Força Aérea perdiam pessoal para o EMGFA, para o chefão agora donozinho daquilo tudo. Esta notícia é aliás sintomática do que são a maioria dos OCS, e como tão facilmente passam recados.

O mesmo Expresso (cujo dono foi dos que mais recebeu do governo como ajuda excepcional e temporária) divulgava em 23 de Dezembro que o ministério das defesa nacional iria encaixar 105 milhões de euros com a cedência de sete imóveis e, em consequência, garantindo 21 milhões de € anuais para obras nos três ramos das Forças Armadas, e até 2026. Depois, no fim da notícia, escreveram: até 2026, receberão, 22,4 milhões de euros o EMGFA, 29,5 a Marinha, 45 o Exército, 22,6 a Força Aérea. Não vale a pena continuar a explicar o meu ponto, é lerem e fazerem as contas.

Olhe-se a assuntos de justiça. Não quero falar do Rendeiro, do Ricardo, do Duarte Lima, do Vara, do Vieira, do Pinho, dos mais de dez anos de processos, etc. Os OCS quase sem excepção, bombardeiam-nos com coisas bombásticas, mas quanto a rigor.......Entretêm-se a noticiar, por exemplo, o Ivo Rosa isto e aquilo, mas esquecem-se de explicar com profundidade as vergastadas que o senhor recebe da Relação. Esquecem-se de explicar com rigor onde, em que legislação, o juiz  Carlos Alexandre se escuda para as suas decisões. Gostam mais de o colocar como (quase) um doido varrido.

Há OCS que dão guarida a criaturas que vomitam os maiores dislates, sobre a área da justiça, a área militar, a área financeira, e por aí fora. Mas não lhes fazem as perguntas duras, nada de contraditório. Nem lhes perscrutam o historial, nem procuram perceber quem servem.

Um último exemplo, sobre coisas como os jornalistas deixam sempre passar. Cavaco Silva há poucos dias antes do Natal (Sábado, 22DEZ) defendeu um choque reformista. Depois de ler, voltei a ler, pois admiti ter estado distraído. Disse este ex-PM e ex-PR, ..."se formos capazes de fazer reformas profundas, diria um choque reformista".... (2ª coluna na página 14). A notícia diz, umas linhas abaixo, que Cavaco Silva identificou durante a conversa as reformas que é preciso aplicar. Li e reli as restantes três colunas, NADA, nenhuma reforma foi explicitada. Um artigo para encher chouriços.

Também por isto assim estamos. Oxalá em 2022 alguma coisa nesta área se altere para melhor. A Democracia agradecia.

Antonio Cabral (AC)

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