CULTURA
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Dentro da cabeça das paredes, sobretudo
da cabeça do coração, até se afastarem os móveis,
cobria-se de cal essa certa esperança
de esconder defeitos. Ao se afastarem os móveis,
as paredes deixaram cair pregos, abriram rachas,
mostraram, pudicas, as manchas. Espreitava-se
e via-se-lhes a olho nu o espaço íntimo,
"o sangue inocente" posto sobre nós
no que parecia ser a boca dentada de um peixe.
Paredes, estais hoje mais velhas do que nós.
O branco, demasiado aberto, não vos assenta bem.
Tentamos vestir-vos de quadros e desenhos;
já nada vos serve: o homem das obras ordenou
a demolição. "Porque tu, senhor, fizeste como te agradou":
três dias e três noites em oração contra Ti.
"A grande tempestade por causa de mim"
expôs como ferida em carne viva o esqueleto
da casa. Ossos feitos de material de construção.
(Inês Fonseca Santos)
AC
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