segunda-feira, 14 de janeiro de 2019

LIDO POR AÍ
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Quando eu, com a minha idiossincrasia, conheci a tia Filomena, gozava a mulher de uma reputação que, a falar verdade, não se podia dizer das mais lisonjeiras.
A gente da vizinhança - as vizinhanças na aldeia compreendem-se num círculo de três léguas de raio - teimava a pés juntos que ela mantinha sinistras relações com espíritos ruins, que aos Sábados não faltava às soirées do diabo; e enfim que era a pobre velha nem mais nem menos do que uma ladina e famigerada feiticeira.
Punge-me de ter de arquivar aqui, forçado como sou pela veracidade de cronista, que a origem principal de semelhantes boatos a fui encontrar na parte bela e amável do sexo, do qual a tia Filomena era um espécime avariado.
A beleza e a juventude fazem disto. As que as possuem, orgulhosas desses dotes sedutores, invejam-se e odeiam-se mútua e cordialmente; ao mesmo tempo que desprezam e caluniam as desfavorecidas nesse ponto pela nem sempre muito imparcial natureza.
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(O espólio do senhor Cipriano, Júlio Dinis)
AC

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