Já agora para ajudar as sumidades incomodadas
Ainda o segredo de justiça
Cândida Almeida
Ex-diretora do DCIAP
23 junho, 2024 às 00:02
A violação do segredo de justiça foi, mais uma vez, notícia nacional replicada em todos os média. Considerando a relevância social e política do processo Influencer, do qual foram extraídos os excertos das escutas telefónicas tornadas públicas, logo se sucederam os debates, as críticas direccionadas e os artigos de opinião. Num desses escritos, a cujo autor reconheço fina ironia e inteligência, detecto, porém, um lapso fundamental na apresentação dos actores intervenientes, que delimita a um único personagem: o MP. Importa, porém, incluir os esquecidos. A CRP consagra expressamente a protecção do segredo de justiça. Até 2010, o CPP determinava a sujeição da fase de investigação a segredo absoluto. A partir de então, o legislador alterou radicalmente a tradição, passando o “processo penal a ser, sob pena de nulidade, público, ressalvadas as excepções previstas na lei”. Estas implicam um carrossel no movimento do processo. O MP pode determinar a aplicação do segredo de justiça, mas o JIC tem de a validar no prazo de 72 horas. No caso de o MP não permitir o acesso aos autos, o arguido, o assistente e ofendido podem requerer o levantamento ao JIC de tal proibição. Assim, para além do MP, titular do inquérito, participam neste labirinto processual o órgão de polícia criminal que auxilia na investigação, os funcionários judiciais respectivos e o JIC para decisão irrecorrível. Acresce que o mesmo normativo estabelece que a publicidade implica, além do mais, a consulta do auto, a obtenção de cópias, extractos e certidões de quaisquer partes dele. A questão primeira que se coloca, actualmente, em qualquer processo, é saber se o mesmo está ou não em segredo de justiça. Se sim, assistir-se-á à procissão dos autos já referida. Se não, o processo é público, pode ser consultado e esventrado. O mesmo artigo assegura que a publicidade não abrange os dados relativos à reserva da vida privada, ou política, que não constituam meios de prova. Aqui chegados, pergunta-se: o MP, no processo em causa, entendeu o conteúdo das referidas escutas como integrando o acervo de meios de prova? Se assim não foi, devia de imediato ter promovido ao JIC a sua destruição, por não ser relevante para a investigação. A mesma norma determina, ainda, que, relativamente aos meios da Comunicação Social, não é autorizada, sob pena de desobediência simples, a reprodução de peças processuais ou documentos incorporados no processo até à sentença da primeira instância. Assim, são vários os intervenientes que podem ter divulgado as referidas escutas, devendo apurar-se, com rigor e profundidade, os seus autores. Viola a regra da presunção de inocência a afirmação contida nas intervenções públicas que apontam como responsável o MP. O ataque simultâneo a políticos e ao MP é muito conveniente aos “senhores do colarinho branco” que pretendem colocar em causa todo um sistema de justiça equilibrado e equitativo e o sistema político democrático em vigor.
Cândida Almeida
Ex-diretora do DCIAP
23 junho, 2024 às 00:02
A violação do segredo de justiça foi, mais uma vez, notícia nacional replicada em todos os média. Considerando a relevância social e política do processo Influencer, do qual foram extraídos os excertos das escutas telefónicas tornadas públicas, logo se sucederam os debates, as críticas direccionadas e os artigos de opinião. Num desses escritos, a cujo autor reconheço fina ironia e inteligência, detecto, porém, um lapso fundamental na apresentação dos actores intervenientes, que delimita a um único personagem: o MP. Importa, porém, incluir os esquecidos. A CRP consagra expressamente a protecção do segredo de justiça. Até 2010, o CPP determinava a sujeição da fase de investigação a segredo absoluto. A partir de então, o legislador alterou radicalmente a tradição, passando o “processo penal a ser, sob pena de nulidade, público, ressalvadas as excepções previstas na lei”. Estas implicam um carrossel no movimento do processo. O MP pode determinar a aplicação do segredo de justiça, mas o JIC tem de a validar no prazo de 72 horas. No caso de o MP não permitir o acesso aos autos, o arguido, o assistente e ofendido podem requerer o levantamento ao JIC de tal proibição. Assim, para além do MP, titular do inquérito, participam neste labirinto processual o órgão de polícia criminal que auxilia na investigação, os funcionários judiciais respectivos e o JIC para decisão irrecorrível. Acresce que o mesmo normativo estabelece que a publicidade implica, além do mais, a consulta do auto, a obtenção de cópias, extractos e certidões de quaisquer partes dele. A questão primeira que se coloca, actualmente, em qualquer processo, é saber se o mesmo está ou não em segredo de justiça. Se sim, assistir-se-á à procissão dos autos já referida. Se não, o processo é público, pode ser consultado e esventrado. O mesmo artigo assegura que a publicidade não abrange os dados relativos à reserva da vida privada, ou política, que não constituam meios de prova. Aqui chegados, pergunta-se: o MP, no processo em causa, entendeu o conteúdo das referidas escutas como integrando o acervo de meios de prova? Se assim não foi, devia de imediato ter promovido ao JIC a sua destruição, por não ser relevante para a investigação. A mesma norma determina, ainda, que, relativamente aos meios da Comunicação Social, não é autorizada, sob pena de desobediência simples, a reprodução de peças processuais ou documentos incorporados no processo até à sentença da primeira instância. Assim, são vários os intervenientes que podem ter divulgado as referidas escutas, devendo apurar-se, com rigor e profundidade, os seus autores. Viola a regra da presunção de inocência a afirmação contida nas intervenções públicas que apontam como responsável o MP. O ataque simultâneo a políticos e ao MP é muito conveniente aos “senhores do colarinho branco” que pretendem colocar em causa todo um sistema de justiça equilibrado e equitativo e o sistema político democrático em vigor.
Os doutores dos 50+50, mais os incomodados, terão lido e particularmente o que sublinhei?
AC
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