Dispenso a reforma do Estado
Do que gostava é que, havendo ministro e ministério, se focasse em duas coisas: tirar o Estado de todo o lado em que cria mais problemas que resolve, e aplicar o código do procedimento administrativo.
Não tenho nada contra a existência de um ministério e um ministro para a reforma do Estado, acho bem que o primeiro-ministro dê prioridade ao assunto, mas na verdade, em relação à reforma do Estado, tenho a mesma posição que em relação às eleições autárquicas: do que preciso é de um Presidente de Câmara que garanta que as sarjetas funcionam adequadamente, não de um Presidente de Câmara com visões estratégicas de excelência.
Estou convencido de que os governos, e a generalidade dos poderes públicos, são muito menos importantes do que pensamos e, sobretudo, do que cada governante pensa, enquanto ocupa esse lugar.
Um ministro manda muito pouco, felizmente, na generalidade dos casos, menos felizmente na hipótese, improvável, de termos uma pessoa excepcional a ocupar um lugar de poder.
Do que eu gostava é que, havendo ministro e ministério, se focasse em duas coisas, qualquer delas incomparavelmente mais fáceis de enunciar que de materializar.
A primeira coisa é mais ou menos trivial, tirar o Estado de todo o lado em que cria mais problemas que os que resolve.
Esta ideia não é uma ideia contra o Estado, é uma ideia de quem, tendo quase toda a vida trabalhado no Estado, sabe que há vantagem em que o Estado se concentre em fazer bem o que mais ninguém faz, em vez de procurar resolver todos os problemas do mundo.
A segunda coisa é ainda mais trivial, concentrar o esforço do ministro e do ministério na aplicação concreta e integral do código do procedimento administrativo.
Dispenso coisas nunca vistas, ideias disruptivas, vontades indómitas de fazer o que nunca foi feito, prefiro que se o código do procedimento administrativo determina “3 – As informações solicitadas ao abrigo do presente artigo são fornecidas no prazo máximo de 10 dias.” (alínea 3 do artigo 82º, do DL Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de Janeiro de 2015, Código do Procedimento Administrativo) e na verdade isso raramente acontece, o ministro e o ministério se empenhem em perceber por que razão há um incumprimento generalizado da lei (normalmente isso significa que a lei não é muito sensata) e, sobretudo, por que razão, havendo esse incumprimento, ninguém é responsável por isso.
Escolhi um exemplo ao acaso, mas se a generalidade das pessoas que falam da reforma do Estado se entretivesse a tentar aplicar, em concreto, as medidas bondosas previstas nesse código, tendo em atenção as excepções, de maneira geral sensatas, nele contidas, estou convencido de que seria mais eficaz a reformar o Estado, sem necessidade de inventar nomes catitas, como Simplex, ou contar histórias infantis com vacas que voam.
A maneira mais simples de o fazer não é mandar estudar por que razão o organismo X não cumpre o código, a maneira mais simples é mesmo fazer um teste: se alguém mandar um mail para o Senhor Ministro, o Senhor Ministro consegue garantir que me responde (o seu gabinete em seu nome, naturalmente) em dez dias, nem que seja respondendo-me que não tem resposta?
Uma resposta automática a dizer que o meu mail é muito importante para os senhores e será respondido com a maior brevidade possível não serve, isso não passa de um cumprimento formal da norma, sem o seu cumprimento substancial, a norma é taxativa na indicação de que eu tenho direito a uma resposta em dez dias.
Era só isto que eu queria, um ministro e um ministério que se empenhassem em aplicar o que existe, avaliar os efeitos disso e, só depois, procurassem novas soluções para o velho e antigo problema da responsabilização dentro do Estado, que é a base de tudo o resto.
Até lá, boa sorte, mas por favor não me falem dos amanhãs que vão cantar no Estado, de maneira geral as pessoas comuns precisam das suas coisas resolvidas agora, e não quando for possível.
Henrique Pereira dos Santos, 25 jun. 2025, Observador
(sublinhados da minha responsabilidade)
AC
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