sábado, 19 de outubro de 2024

O  PAÍS
Reproduzo em baixo o texto assinado pelo director do Expresso.
(sublinhados e comentários da minha responsabilidade)

É difícil ficar indiferente à imagem de um homem frágil e doente a percorrer os metros que o separam do início do seu julgamento. A responsabilidade é, em primeiro lugar, da Justiça, por, tal como é de lei, exigir a identificação do arguido claramente debilitado perante o tribunal, apesar das inúmeras provas da sua incapacidade. 

Em segundo lugar, do seu advogado, que, para denunciar a inoportuna decisão de exigir a comparência de Ricardo Salgado no início do julgamento, preferiu expô-lo ao ridículo de fazer aquele caminho.

Usar o seu cliente para benefício da defesa é igual ou pior do que a vergonha que lhe foi exigida. (é ainda pior)
Os gritos supostamente encomendados de um alegado lesado do Grupo Espírito Santo (GES) (volto a escrever que todos os lesados são vítimas do GES e não do Banco Espírito Santo) proporcionaram um ato maior de humilhação, que diz muito sobre como estamos a regredir na escala de valores da sociedade. (e digo eu, diz muito sobre o "encenador")

Os gritos daquele indivíduo e a forma como cuspia deliberadamente na cara de Salgado sem que alguém tivesse tido a clareza suficiente para travar o triste espetáculo são uma enorme caricatura da atualidade. (tenho o legítimo direito de considerar que foi uma cena encomendada)

Não há crime que permita que se ponha em causa a dignidade de um ser humano daquela forma. É como se tivéssemos regressado ao tempo no qual os criminosos eram obrigados a percorrer as ruas a caminho do pelourinho local.

Não me entendam mal, Salgado e todos aqueles que, de forma consciente e consistente, se associaram para criar uma realidade alternativa sobre a saúde financeira do Grupo Espírito Santo têm de ser julgados.
Demore o tempo que demorar, mesmo que alguns dos intervenientes já
nem possam responder pelos seus atos, deve ser feita justiça perante aquele que foi um dos maiores escândalos financeiros dos tempos modernos.

O processo é gigante. Um mega-processo, como gostam de apelidar
estes casos e que parece agradar a todos os envolvidos. A imensidão das provas, dos depoimentos, dos relatórios, o número dos envolvidos e os crimes em causa permitem à Justiça mostrar a sua força, aos arguidos protelar o julgamento, que vai durar anos e anos (mesmo sem contar com os recursos que se seguirão), e garantem trabalho contínuo ao enorme número de advogados envolvidos

Apesar de o rol de arguidos ser extenso, há muitos, muitos e muitos ausentes. No banco dos réus, mesmo sem ser acusada, estará uma grande parte da elite de Portugal. 
Empresários, políticos, gestores, homens e mulheres das artes e dos espetáculos que anos a fio se alimentaram da teia criada por Ricardo Salgado, que o veneravam e idolatravam. E que ao longo de anos e anos a fio não tiveram sequer a capacidade de questionar (não lhes interessava, estavam e continuam no bem bom) a origem de tanto poder. 

E ainda aqueles que duvidavam da estabilidade do império, mas a quem faltou coragem para falar publicamente do assunto. (faltou coragem?)
Ou aqueles que, apesar das notícias que começaram a ser publicadas um ano antes da falência e que davam conta não só da debilidade mas
também das falcatruas feitas para esconder a realidade das contas, decidiram continuar a confiar no nome da família que era Dona Disto Tudo.

Os mesmos que depois vieram exigir ao Estado que lhes resolvesse o problema com a ajuda dos contribuintes.
Há todo um país que devia estar sentado ao lado de Salgado
Há todo um rol de gente que devia sentir a vergonha de ser Espírito Santo. Há todo um mar de gente que devia ter sentido a humilhação de percorrer aqueles metros até à porta do tribunal.
jvpereira@expresso.impresa.pt

Um país com uma justiça assim, com juristas assim, com gente assim, não precisa de mais nada para se definir.
FELIZMENTE o digo e de há muito, vivo neste regime e assim seja no futuro, ao abrigo da Constituição,  mas considero que um país com estas coisas é uma vergonha de país. INFELIZMENTE.

AC

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