FORA DA AGENDA
"Fora da agenda", esta expressão foi há dias de novo empregue e relatada designadamente no Expresso, a propósito de uma audiência com carácter de muita urgência solicitada pelo actual Chefe do Estado-Maior da Armada (CEMA) ao Presidente da República que, constitucionalmente, é o Comandante Supremo das Forças Armadas (para mim parece-me cada vez mais um comandante superficial das Forças Armadas). Audiência solicitada na sequência do veto político do actual e polémico chefe de estado-maior general das Forças Armadas (CEMGFA que, curiosamente, é um oficial de Marinha) ao oficial indigitado pela Marinha/ CEMA para Comandante Naval. Veto obviamente apadrinhado pelo actual ministro da Defesa Nacional (MDN).
Um veto político que consubstancia várias coisas, nomeadamente a arrogância do poder recentemente obtido, a governamentalização agora absoluta/ completa/ descarada das Forças Armadas, como não fora até aqui.
É legítimo considerar que, dado um dos protagonistas deste veto, o mesmo integra também outros ingredientes, a saber, o da vingança pessoal repugnante, e a manobra vergonhosa que poucos na sociedade perceberão mas que é clara para quem conhece o assunto e a insídia inerente a quem assim procede.
Mas, voltando ao tema, "fora da agenda", tem a ver com, designadamente, certos rituais próprios de instituições não só mas nomeadamente do Estado. Porque, faz parte dos rituais e regras, na maioria das vezes quer para audiências a altas entidades, titulares de órgãos de soberania, dirigentes diversos, que essas audiências sejam previamente acordadas, agendadas, divulgadas e, é muito frequente que os protagonistas, quer quem recebe quer quem é recebido, sejam posteriormente ouvidos pelos orgãos de comunicação social exactamente para perceberem/ saberem e reportarem o que se passou, foi analisado, acordado ou não.
Mas, como foi agora o caso supra referido, encontros/ audiências há que, solicitadas ou não com urgência, não são previamente divulgadas independentemente de, depois, se vir a saber que tiveram lugar. São e ficam designadas por "fora da agenda". Muitos desses encontros/ reuniões/ audiências não tem carácter de urgência, são muitas vezes reuniões cordiais que mantêm diálogo, amizade, relacionamento institucional, etc. E, em regra, contrariamente às formalmente agendadas, quem sai dessas audiências não tem jornalistas à sua espera, porque os OCS não foram informados.
Na fase final da minha carreira passei por várias das duas situações, na maioria formais e agendadas (por mim solicitadas umas, outras que me foram solicitadas), em que à saída tinha os órgãos de comunicação social à minha espera, bem instruídos por quem me recebera para apertarem comigo. Mas nunca tiveram sorte, porque sendo eu só normal, sou relativamente cuidadoso e prudente e sempre estudei os assuntos da minha área de responsabilidade. Ainda por cima, temas quentes nessa época e por resolver, eram mais da responsabilidade da entidade que me recebia que da instituição que eu representava. O que claramente e persistentemente sempre denunciei, e bons resultados deu.
Esta questão "fora da agenda" (que me foram solicitadas, quase só para conversa) tem outros contornos interessantes ou curiosos. Pessoas que são recebidas "fora da agenda" podem, por exemplo, chegar ao local da audiência e não entrar pelo acesso mais habitual. Ou podem usar um elevador especial vedado a outrem. Conheço bem um caso concreto de um edifício concreto. "Fora da agenda" tanto pode ocorrer numa dada instituição, como em casa de A ou B e assim se dizer depois que nunca houve encontro, que nunca se soube de nada, que não houve memorando, telefonema etc.
"Fora da agenda" pode, portanto, passar por ser muita coisa. Pode ser até, por exemplo, ir à mesma missa onde se sabe que Ele vai regularmente, para aí combinar coisas. Ou pelo menos para se sabujar como é típico de sabujos e insidiosos. Pode ser, também, pedir a um alto funcionário alguém para cargo muito importante num palácio tipo assessor directo ou "chefe da" e, depois de tudo combinado, uns dias mais tarde em outro "fora da agenda" concretamente por telefone, dizer a esse alto funcionário - que maçada, desculpe, mas já não pode ser, é que entretanto arranjei outro!
Coisas curiosas da sociedade e de certas criaturas.
AC
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