(Opinião pessoal, naturalmente) (sublinhados da minha responsabilidade)
7 de outubro. O deslaçar da civilização
(DN) (Valentina Marcelino)
O grande dilema para todos os que vivem nas culturas democráticas é conseguir compreender que o combate contra este terrorismo, que usa a própria população como escudo humano e a convence de que será mártir quando morrer pelas suas causas, dificilmente terá sucesso apenas com as regras dos Estados de Direito.
Publicamos nesta edição dois artigos de opinião corajosos e oportunos. Um do escritor e antigo repórter de guerra espanhol, Arturo Pérez Reverte, outro do politólogo e um dos mais qualificados especialistas em terrorismo, Diogo Noivo.
O que escrevem atira-nos para uma dimensão crua da realidade que vivemos hoje no mundo, em relação à qual qualquer olhar, opinião, corre o risco de quebrar o cada vez mais ténue e frágil fio que nos liga a todos como Humanidade.
É assim que neste dia 7 de outubro, um ano depois do massacre perpetrado por terroristas palestinianos do Hamas, em resultado do qual foram assassinados mais de 1200 pessoas, a esmagadora maioria israelitas, e raptados outros 200, parece que, cada vez mais, nos entrincheiramos em dogmas e tratados que deixaram de fazer sentido numa realidade em que o poder da força se está a substituir ao da razão.
Como lembra Diogo Noivo, a história vai deixando lições, mas quase nunca se aprende com elas. Recorda que em 1965, a organização terrorista ETA explicou em documento interno a estratégia beligerante: “ação-reação-ação”. Ou seja, atacar o Estado com violência; provocar com esse ataque uma reação desproporcional das autoridades policiais, no caso sobre a população basca; finalmente, a frustração e a raiva populares suscitadas pela resposta do Estado, dariam à ETA o apoio popular necessário para a guerra.
Ora, o que aconteceu a sete de outubro em Israel, a reação que se seguiu e a situação de escalada em que se encontra o Médio Oriente, demonstra bem como, 59 anos depois, aquela estratégia ainda funciona. E como países com tanta experiência em contraterrorismo, como é o caso de Israel, ainda caiem na armadilha.
O problema e grande dilema para todos os que vivem nas culturas democráticas ocidentais é conseguir compreender que o combate contra este terrorismo, que usa a própria população como escudo humano e a convence de que será mártir quando morrer pelas suas causas, dificilmente terá sucesso apenas com as regras dos Estados de Direito a que estamos habituados.
Pérez-Reverte traz à superfície muitas das apreensões que, por muito que as continuemos a tentar esconder em nome do humanismo e solidariedade, são cada vez mais reais e traduzem, precisamente, o corte nesse fio que nos devia continuar a ligar.
O politicamente correto, a falta de verdadeiras estratégias de integração de imigrantes de cultura não judaico-cristã, baseadas no respeito pelas regras democráticas e pela liberdade dos países que os acolhem há décadas, contribuem para um deslaçar cada vez mais irreparável das tais pontes que constituem uma sociedade multicultural sã - a civilização que, com a liberdade que conquistámos, tentamos aperfeiçoar todos os dias.
Enquanto isso, no Médio Oriente, Israel reage como um “animal ferido”, aproveitando aqui a expressão utilizada pelo embaixador António Monteiro, na entrevista DN-TSF da passada sexta-feira, e mata dezenas de milhar com o seu esmagador poder bélico. Perde apoiantes, aliados, amigos e fortalece o antissemitismo que nunca adormeceu.
Mais uma vez, alimentam-se os extremismos, a insanidade, criam-se cada vez mais fronteiras ideológicas. Mais uma vez, a estratégia dos terroristas e dos extremistas está a resultar. E a forçar que cada um escolha a sua trincheira.
AC
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