quinta-feira, 10 de março de 2022

Os  MAIS  FRÁGEIS  da SOCIEDADE

Há umas semanas li este artigo. Volto a ele por razões diversas e particularmente por nova situação concreta que conheço muito bem. Li-o agora ainda com mais atenção e mais fico com a sensação da superficialidade com que abordam este complexo tema da sociedade. 
É um tema sobre o qual, por razões da vida, tenho um conhecimento  razoável. 
E falar disto não deve ser baseado em conversa com alguém de uma IPSS há anos instalado na estrutura. Ou mesmo que seja com mais que uma dessas pessoas. É preciso muito mais. 
Este assunto não pode ser encarado com superficialidade. 
A sociedade, todas as sociedades, têm cidadãos com muitas fragilidades, sendo uma parte substancial os idosos.

Isto dito, e se "acuso" de superficialidade o artigo e inerentemente o jornalista e o jornal, também reconheço não ser possível aqui neste modesto blogue escrever um "tratado" sobre o assunto. Mas tentarei aflorar alguns aspectos. Realidades que no artigo não encontro com rigor.

Em todos os assuntos se deve ter por indispensável a procura da verdade, a verdade dos factos, o aprofundar e analisar dificuldades e parâmetros envolvidos, procurar perceber que soluções possíveis para cada problema/ assunto.
No caso concreto dos idosos ou mais politicamente correcto - seniores - para mim isto é ainda mais importante.

Do artigo saliento 9 aspectos que me pareceu que o jornalista queria enfatizar: 
- preço mínimo por vaga/ mês; 
- a construção para atender ao apoio a idosos parece estar a ser atractiva; 
- tão atractivo está este segmento do investimento imobiliário que estão aparentemente a aparecer investidores nacionais e estrangeiros; 
- apesar de alguma construção nos tempos mais próximos, é apontada uma escassez generalizada; 
- as mensalidades a pagar dependem naturalmente da condição física do idoso:
- o artigo aponta 1175€ / mês como mensalidade mínima do sector social e, se percebi bem, 1200€ no sector privado;
- há pressão ao nível da procura de recursos humanos; penso que se pretende referir aos recursos humanos para trabalhar nas instituições;
- o artigo refere que a segurança social via PRR disponibilizará 300 milhões de euros
- o rendimento anual por unidade atingirá 5,75 %, perspectivando-se uma gradual subida do investimento nestes activos imobiliários.

Como disse não é possível aqui abordar com profundidade este complexo assunto. Mas aqui vai alguma coisa.
Para continuação de conversa, porque sei alguma coisa deste assunto? 

Porque conheço razoavelmente experiências e dificuldades várias vividas por mais velhos que a minha idosa (terá 97 em 8JUL) mãe (família afastada, como primos e tios dela), familiares de amigos chegados, mãe do meu genro, mãe de uma cunhada, e o trabalho de investigação que fui fazendo entre 2011 e 2019 já prevendo o futuro. Em 2019, a minha mãe, por sua vontade, e apesar de manter (como mantém) mobilidade usando uma bengala de 4 pontas por precaução, com uma cabeça fantástica, com limitações de visão e audição, quis passar a viver num lar. E assim foi a partir de Maio desse ano. Não foi nada fácil arranjar coisa decente.

O meu pai faleceu em 2011, mas ela quis continuar a viver sozinha na sua casa, para onde regressou logo após o funeral. Foram 8 anos, com o meu apoio semanal para compras, apoio periódico para aspectos de saúde, apoio periódico em fins de semana em minha casa para conviver sobretudo com os netos e bisnetos. 
Sei alguma coisa deste assunto. 

O acompanhamento dos cidadãos mais velhos é uma questão complexa em todas as sociedades, mas particularmente em países como Portugal, onde se finge ser um país rico, onde se vive como se vê cada vez mais, e em que as elites são fraquíssimas e muitas são mesmo reles, mas têm vida e comportamentos de rico.

As infra-estruturas para apoio a idosos são de dois tipos: privados e de âmbito social com forte ligação à segurança social.
A avaliação da saúde de uma sociedade também se deve fazer olhando a como o Estado ou seja, os poderes públicos e concretamente os governos, tratam das crianças e dos idosos.

E o que são os lares?
Superficialmente, digo eu, devem ser infra-estruturas onde os idosos ainda bem de saúde mental ou já não, com mais ou menos limitações, possam ser acolhidos, acarinhados, dando-lhes adequada ocupação física e espiritual, acompanhados em todos os planos que não apenas os de saúde. Infra-estruturas e instituições privadas ou associativas, em que todas, sem excepção, deviam ser anualmente fiscalizadas pelos serviços dos sucessivos executivos.
Pergunte-se a Lino Maia e a Manuel Lemos que estão há décadas a chefiar este tipo de "instituições / estruturas" que eles explicarão melhor o que se tem feito de bom, o que está frágil, o que está mau. 

Foi com a Constituição que surgiu o termo IPSS (Instituição Particular de Solidariedade Social). 
As IPSS são instituições ou organizações constituídas por iniciativa exclusivamente privada, sem fins lucrativos, para promover a igualdade e a justiça social, nos planos da segurança social, educação e saúde. A sua atuação enquadra-se no âmbito da economia social, e têm como principal objetivo a solidariedade social, em domínios como a segurança social, educação e saúde.
Fala-se em cooperação com o Estado, mas a realidade é que a Segurança Social contribui decisivamente para as IPSS. 
É absolutamente ridículo ver algumas criaturas afirmar que o Estado não tem lares, que não têm estas infra-estruturas de acolhimento. Naturalmente, fala-se em associações de solidariedade social, como associações de voluntários, como associações mutualistas, eventualmente de fundações neste domínio social. E, desde tempos remotos, existem as Santas Casas de Misericórdia.

Portanto, falamos de apoios a idosos e por essa via a famílias, a proteção na invalidez, a proteção em situação de carências graves, etc.
Neste âmbito e no presente, quando falamos em "
economia social", temos por exemplo as Santas Casas sob o chapéu da União das Misericórdias Portuguesas. 
Mas temos mais, a Confederação Portuguesa de Economia Social (CPES) que designadamente congrega, a União das Misericórdias Portuguesas, a Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade, a Confederação Portuguesa das Coletividades de Cultura, Recreio e Desporto, a União das Mutualidades Portuguesas, a Associação Portuguesa para o Desenvolvimento Local, a Confederação Cooperativa Portuguesa, e a Associação Portuguesa de Mutualidades.

Mas temos também muitas outras coisas. Temos casas, vivendas, prédios pequenos, que estão transformados em lares, com designações diversas. Basta ir à Internet, ou fazer caminhadas em vários locais para descobrir isso (repouso, acolhimento, etc.). E temos pelo interior do país imensos ditos lares em que anualmente vários são fechados mas muitos mais subsistem sendo que as condições deixam algo a desejar.

Com a pandemia muito ficou a nu! Muito do que há décadas se esconde. Alguns, mais violentos, chegaram a escrever existirem dois tipos de cemitérios, os dos mortos e os dos vivos. Adiante.

Por mim, creio continuar a existir alguma clandestinidade neste âmbito. E, portanto, digo eu, temos pelo país fora lares ilegais/ clandestinos em que alguns de vez em quando são descobertos, lares legais com condições deficientes, lares legais com condições razoáveis ou mesmo boas. E temos, portanto, lares numa vivenda pequena onde se amontoam idosos, lares em ruas conhecidas das avenidas em Lisboa com escassos utentes e preços carotes, lares em edifícios de 3 ou 4 andares com perto de 100 idosos, etc. Teremos, provavelmente, mensalidades desde 700 €, algumas de 1000, de 1350, de 1500, de 3500 €. Sim 3500,00€. E fico por aqui quanto a preços.

Olhadas as 9 questões supra apontadas, a questão dos preço fica por aqui. Basta consultar a NET, e depois fazer perguntas em certas zonas para se perceber que quanto a preço há muito que ponderar e não me parece que seja apenas o que o artigo refere. Até porque, depende da condição do carenciado.

Passando às questões imobiliário/ novas construções/ escassez de infra-estruturas, em que o jornalista confessa que está a ser uma coisa atractiva, isto deixa campo a muitas interrogações. Desde logo, que requisitos são impostos pelas autoridades para novas construções destinadas à economia social? Estou a perguntar, pois até coloco a possibilidade de nada se impor e depois as autoridades competentes no âmbito da segurança social inspecionarem as novas unidades. É uma área com pano para mangas, e muitas dúvidas.

Conhecendo muito bem quatro infra-estruturas de acolhimento de idosos/ carenciados, um dos aspectos que mais me tem chamado à atenção é o problema dos recursos humanos por outras palavras, "o recheio" formado pelo conjunto dos profissionais para lidarem diariamente com pessoas em que, na maioria dos casos, têm grande limitações físicas e psíquicas.

Porque, o que é um lar? Local onde vivem seres humanos frágeis.
Um lar tem alguém que o dirige. Pode ter uma directora tonta ou uma eficaz que não delega na enfermeira chefe as suas responsabilidades directas.
Deve ter apoio médico dedicado, e há normas para isso. E enfermeiros.
Fornece alimentação, havendo quem a confecione dentro da casa, e quem a receba de "catering". Deve ter serviço de limpeza. E um que conheço bem tem limpeza diária duas vezes por dia (quartos, corredores, etc. Outro............adiante.

Lares há que têm entretenimentos semanais, apoio psicológico, educação física/ ginástica apropriada para idosos, ocupação de tempo livres. Saídas para os que fisicamente para isso têm condições. Conheço quem tenha até barbeiro e cabeleireira. Muitos não terão nada disso, como por exemplo, certas vivendas ou andares adaptados a lares. Alguns terão agregadas instalações para cuidados continuados.
Há associações integrando lares que dão apoio na comunidade onde se inserem.

E além disto há que considerar mais aspectos de que dou apenas alguns exemplos; o serviço de apoio domiciliário por parte de Santas Casas de Misericórdia e associações diversas, centros de dia (muitos fecharam na pandemia), centros de convívio.

Para perceber ou pelo menos ponderar sobre alguns dos problemas que se colocam no que respeita aos recursos humanos, vale a pena reparar em quem cozinha, à idade e à cor da pele, à nacionalidade. Atente-se no pessoal de enfermagem, à idade. Atente-se no pessoal administrativo. Atente-se à direcção.
Que formaçãoE quanto lhes pagam? E o esforço físico e psicológico de alguns/ algumas, a quem lhes tem que ser dada folga de 4 em 4 dias? 
Como resolvem os problemas logísticos e de manutenção de equipamentos?
E desde as Santas Casas das Misericórdias a todas as outras IPSS, todas têm quadros de pessoal aprovado? E quanto aqueles lares em vivendas e prédios pequenos, que atenção lhes dedica a Segurança Social/ governos?

Vale a pena lembrar que a propriedade física das infra-estruturas não tem por "dono" o Estado. Sim. Mas há normas a elaborar e fazer cumprir, há enquadramentos legais a cumprir, há necessidade de fiscalizações, definição de quadros de pessoal e de competências. Ou não?

O assunto LARES é um assunto político, há aqui uma necessidade de política social séria, e que não pode ficar por loas, propaganda e parangonas.
À boa maneira de uma certa súcia de pessoas, agora com o PRR é que as coisas se vão resolver?

O imobiliário na área da economia social está a atrair muito investimento. Pois é, a tal coisa sem fim lucrativo. Quem controla?

Como disse, assunto complexo, é preciso conhecer e pensar.
Antonio Cabral (AC)

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