sexta-feira, 14 de fevereiro de 2025

SOBERANIA, INDÚSTRIA, DEFESA . . . .
o COSTUME . . . . . 
DIÁRIO DE NOTÍCIAS, Valentina Marcelino
General Valença Pinto: “A conjuntura sugere que se dê uma muito maior prioridade à Defesa”

O presidente da EuroDefense-Portugal revela que a associação está a preparar, com as 16 congéneres europeias, um conjunto de recomendações para a estratégia industrial de defesa. Para o General Valença Pinto, ex-Chefe de Estado-Maior-General das Forças Armadas, neste setor deve haver na UE “soberania partilhada”.

No atual contexto de instabilidade geopolítica da Europa, está em cima da mesa uma estratégia industrial para a defesa da União Europeia? Em que fase é que Portugal está neste momento?

Portugal está, com certeza, muito atento e é preciso que esteja. Estão muitas coisas em cima da mesa, muitas coisas a mexer, nesta nova estratégia industrial de Defesa para a Europa. Há depois o lado financeiro, com o Fundo Europeu de Defesa, que está significativamente dotado e que vai ser ainda mais dotado e de uma forma bastante sensível no futuro próximo. A Comissão Europeia tem agora um comissário para as Indústrias de Defesa e até meados de março deverá ser apresentado um livro branco. A EuroDefense, com as suas 16 associações em toda a Europa, está desde novembro a trabalhar intensamente para preparar um conjunto de recomendações.

A opinião pública está preparada para este debate?

Nem a opinião pública nem para além da opinião pública. O que se passa é um grande desconhecimento. E é um viver muito de costas voltadas uns para os outros. Daqueles que deviam ser os parceiros deste processo. O progresso europeu nesta matéria não será efetivo se não conseguirmos a convergência de três tipos de entidades. Por um lado, o Estado, a Administração Pública, incluindo as Forças Armadas. Por outro lado, a Academia lato sensu e também nela incluindo o sistema científico e tecnológico nacional. Em terceiro lugar, o mundo empresarial e, em particular, o mundo industrial. Há quem chame isso o “Triple Helix”. É o que queremos. Precisamos da propulsão articulada conjugada destes três componentes para que a coisa toda avance. Em Portugal estamos a tentar fazer isto mexer...

Quem devia de fazer isso?

Penso que até de um ponto de vista de responsabilidade política,
era o Estado, mas tem tido dificuldades. Em boa verdade, quem tem feito mais este tipo de tentativa de articulação entre todas estas partes tem sido o EuroDefense. Não o digo para me vangloriar disso, porque tenho pena que seja preciso uma entidade da sociedade civil a fazê-lo. Acho que o Estado vai assumir um papel maior, forçosamente, seja no quadro de uma Direção de Recursos que tenha uma componente de armamento e equipamento, seja no quadro da criação de uma Direção-Geral de Armamento. Não pode deixar de ser o Estado a mexer.

Naturalmente, também em articulação com o Ministério da Economia. Também vemos com grande satisfação que depois de tempos em que o Ministério da Economia não mostrou estar disponível para se envolver muito nesta matéria, hoje sinto uma atitude completamente diferente. Mais atenção, mais empenho de uma leitura mais correta das perspetivas que há, porque vai estar disponível muito dinheiro para se fazerem coisas e em Portugal há capacidade para fazer muitas coisas.

Em Portugal ainda temos como meta, em 2029, ter 2% do PIB em despesas de Defesa, cerca de seis mil milhões de euros, mas é possível chegar aos 3 ou 4%, com já admitiu Donald Trump, por exemplo.
Como se consciencializa as pessoas para isso? Estamos a falar de cerca de oito mil milhões de euros, como referiu o embaixador Martins da Cruz, seria praticamente a 3.ª ou 4.ª maior despesa pública, a seguir à Educação e à Saúde…

As pessoas têm de perceber que não pode haver políticas de Saúde, de Educação, de Segurança Social, não há bem-estar e não há desenvolvimento se não houver Defesa
São duas faces da mesma moeda que ou se reforçam mutuamente ou se prejudicam mutuamente. É compreensível que, em determinados momentos, as circunstâncias políticas, económicas e sociais haja maior prioridade de uma em relação a outra. Mas isso é uma prioridade conjuntural. Neste momento, a conjuntura sugere que se dê uma muito maior prioridade à componente da Defesa. Acho que se vai abrir um livro novo, porventura com cores que não vão ser muito cor-de-rosa, a partir do dia 20 de janeiro. Receio bem isso. Além de tudo, o que eu vejo são divisões internas no seio da União Europeia (UE), tudo isso é muito preocupante.

Qual acha que vai ser a marca de 20 de janeiro, data em que Donald Trump toma posse como presidente dos EUA?

Como historicamente sabemos, Trump nunca deu grande importância à Europa. Depois aprovou uma estratégia nacional em que dedicava meia linha, literalmente, à Europa, dizendo que a UE era um rival comercial. E disse aquela coisa extraordinária de que a NATO era um ser obsoleto e sem qualquer interesse. Houve mais coisas pelo meio, mas depois veio a guerra na Ucrânia e tudo se alterou. Como é que as coisas se vão passar? Ninguém sabe. E eu não tenho nenhuma bola de cristal para saber. Mas sei bem que o senhor Trump vai expressar uma atitude muito transacional. Não é bem o nacionalismo ou isolacionismo americano. Vai ser mais uma atitude transacional. Eu dou se tu me deres…

É sempre um homem de negócios…

Mas isto, obviamente, terá como consequência que
temos de investir mais. Outra potencial dificuldade, se for adotada esta postura transacional, é os Estados Unidos, se entenderem manter-se na NATO, decidirem fazer uma leitura caso a caso do artigo 5.º. Seria o colapso da NATO. Houve sempre uma preocupação na NATO de nunca tipificar muito o artigo 5.º, que era exatamente criar flexibilidade por um lado, e, por outro lado, introduzir o potencial adversário, fosse qual fosse, o elemento de alguma ambiguidade. Se houver uma tentação norte-americana, de entre aspas, regulamentar o artigo 5.º, será politicamente muito mau.

O ex-chefe do Estado-Maior da Armada Gouveia Melo falou recentemente sobre a necessidade do reforço orçamental na Defesa, afirmando: “O que interessa termos despesas sociais se não tivermos país?” Acha que estamos já a esse nível?

É uma expressão que o senhor de La Palice não diria melhor. Mas sim, é verdade. Precisamos realmente das duas coisas ao mesmo tempo. Por exemplo, no período de intervenção da troika aqui em Portugal, não tenho nenhuma dúvida que se tinha de dar prioridade às questões da Economia, mesmo em detrimento de outras coisas, como a Defesa. Agora não tenho nenhuma dúvida que tem de se dar uma grande prioridade à Defesa. Podemos ter a convicção e a tranquilidade de saber que não estaremos isolados.

Teremos connosco a UE e na UE vemos por todo o lado uma reforçada atenção e uma clara convocação de importantes recursos para ajudar todos os países nisso.

Estamos a falar de maior investimento em equipamento para guerra convencional ou também de duplo uso, compatível com os objetivos de coesão social, económica e territorial, citando aqui o parecer do deputado José Luís Carneiro sobre o Programa da Indústria de Defesa Europeia?

Na Europa, houve um tempo histórico, não muito recuado, em que a tese predominante era que tinha de ter campeões europeus, tipo Airbus. Hoje, a perspetiva é outra, porque dessa forma muitos países de pequena e média dimensão ficam fora do jogo. Hoje, a preocupação é criar condições para que todo o progresso que se faça sem por em causa a harmonia e a coesão entre todos os países da UE e que haja um lugar inequívoco para as pequenas e médias empresas.


Quais podem ser os nossos setores-chave?

O nosso setor-chave está na imaginação
, em primeiríssimo lugar. Depois a vontade. Mas temos coisas que funcionam muito bem. Por exemplo, a nossa indústria de drones é extraordinária, a indústria aeronáutica, a de sistemas de comunicações e de informações. Temos, certamente, de nos centrar em nichos. Claro, também podemos fazer coisas mais pesadas, como as munições, cuja carência é enorme na Europa.

Ainda não se definiu quais vão ser esses setores em que Portugal deve apostar?

Não há clareza quanto a isso. Devia haver. A EuroDefense está a fazer uma coisa que eu acho absolutamente fantástica: prospetiva. Infelizmente não se faz muito em Portugal. Convidámos 16 entidades, 14 das quais aceitaram, para fazer um estudo para ver como é que neste progresso de hoje até 2035, que capacidades militares e indústrias de Defesa portuguesas se podem casar virtuosamente. Estamos a fazer outra coisa que tem aberto muito espíritos aqui em Portugal.

Fizemos
, pela primeira vez, no ano passado, em 2024, dois cursos avançados em estudos de Economia e de Defesa, um deles com a Faculdade de Economia de Coimbra, outro com ISEG, aqui em Lisboa, em que mais uma vez procurámos ter junto a Academia e gente das Forças Armadas, portanto, do Estado, e das indústrias de grande sucesso. Isto nunca foi feito na Europa e causa aos nossos parceiros e o maior interesse e a maior curiosidade.

A nossa lei de contratação é exigente suficiente, uma vez que a área da Defesa está identificada como uma de maior risco de corrupção?

Temos em Portugal uma lei da contratação pública em matéria de armamento e equipamento, que é mais papista do que o Papa, mais exigente do que o normativo comunitário. Isso, obviamente, tem de ser revisto. Em Espanha, há muito tempo que isso não é assim, tem alguma tranquilidade em não observar o mecanismo comunitário, porque às vezes é mais fácil pagar a multa. E Espanha tem uma dimensão que nós não temos, por causa do mercado latino-americano.

Temos cerca de 400 empresas que contribuem para o setor da Defesa. Há bocado não tive oportunidade de falar do duplo uso. Temos de explorar o duplo uso nas tecnologias, porque isso leva essa preocupação mais abaixo e, portanto, alarga a possibilidade de intervenção às nossas empresas. O núcleo das tais 400 empresas têm uma taxa de internacionalização que ninguém tem na Economia portuguesa. São capazes porque são muito boas tecnologicamente também e têm mercado, tem esse. Têm taxas remuneratórias para os seus funcionários que ninguém mais tem em Portugal.


Que alterações propõe à lei de contratação?

Devia, no mínimo, não ir mais longe do que a imposição europeia desde o Tratado de Roma, em 1950, o qual previa exceções nos mecanismos da livre concorrência europeia. Não estou a sugerir que Portugal assuma uma atitude, como ainda há pouco referi, que alguns países adotam, de desrespeitar a lei e depois pagar as multas. Entendo que é absolutamente indispensável não ir mais longe do que a exigência europeia. Tem sido um colete de forças para a indústria da Defesa em Portugal.


O primeiro-ministro admite rever de novo a antecipação do prazo para alcançar os 2% do PIB, que já antecipou para 2029. O que acha que seria razoável tendo em conta todos os constrangimentos do país?

Seria desejável que se atingisse tão cedo quanto possível. A nossa convergência não pode ser em termos de indicadores macro financeiros, tem de ser em termos de capacidades militares. Precisamos que as nossas forças sejam, do ponto de vista qualitativo, completamente análogas em termos de capacidades e possibilidades às europeias. Isso é que é importante. Que o batalhão português seja igual ao holandês, que a fragata portuguesa seja equivalente à dos italianos. Que o caça português seja equivalente ou igual ao que usam os dinamarqueses ou os belgas. Isso é que é o nosso objetivo.

E isso custa dinheiro. Não é os 2%, Não é uma coisa mágica. Agora eu percebo que é uma coisa que se usa para dar sensibilidade, para sensibilizar a opinião pública. Mas o que é importante é que haja essa convergência em termos de capacidades. No passado, quando nós éramos menos capazes, militarmente falando, por causa das limitações de equipamento, ficámos um bocadinho atrás. Quando isso acontecia, não éramos interoperáveis com os nossos aliados e parceiros. Isso era mau.

Não conseguimos funcionar bem em conjunto. Agora o tempo já é outro. Estamos num tempo em que também na Defesa está a chegar, em particular para a Europa, o modelo da soberania partilhada. Portanto, se ficarmos de fora em termos de soberania partilhada, ficaremos claramente um país muito, muito, muito baixo na escala. No contexto da UE isso não pode acontecer

Como é que essa “soberania partilhada” se vai conciliar com o crescimento dos nacionalismos europeus que se verifica?

Pois, é um enorme desafio e um enorme problema para lhe dar uma espécie de medida da inquietação que isso provoca. O que se está a formar na Europa Central é extraordinariamente preocupante. Quando vamos a uma reunião internacional europeia, percebemos, sem nenhuma sombra – não vou dizer se está certo ou se está errado –, que os países escandinavos, os países do Báltico, a Polónia, estão em pé de guerra. Só não estão a combater, mas estão em pé de guerra. Nós estamos aqui com estas discussões e estamos a ver no centro da Europa a conjugar se uma espécie de um núcleo, se não é pró-Putin, pelo menos não é contra, com todas as suas agressões ao direito internacional, ao direito humanitário e à boa convivência das nações
.

Para começar, depois de ter lido esta entrevista (sublinhados da minha responsabilidade) que é, basicamente, mais do mesmo (i.e. livro branco), coloquei-a de lado, para olhar ao assunto quando tivesse mais paciência. Vou começar agora.

Começo por relembrar:

"You have (or not) a Navy". "You raise an army".
Só para que fique claro!

E para que fique claro, também, nesta entrevista não há referências ao que, 50 anos depois, continuam a fingir que não é importante e assim prosseguem com grandiloquências e vacuidades, e a atirar para debaixo do tapete.

Por exemplo:

- Portugal deve ter, ou não, Forças Armadas (FA) ?
A minha resposta é SIM.

- Mas que FA deve Portugal ter, atendendo à sua geografia, atendendo aos riscos e ameaças, atendendo à sua política externa, e à política de alianças?

- E atendendo às lições que se podem e devem tirar designadamente dos conflitos na Ucrânia e no Medio Oriente?

Antes de continuar, recordar também recentes declarações de "alguns artistas" ou "sumidades" que toda a vida foram não só como conhecidos "doutrinadores" como grandes defensores e defensoras da nossa segurança e da nossa defesa e das nossas forças armadas (FA), como António Costa ou esta senhora que foi chutada para o bem bom na Europa - Ana Catarina Mendes alerta para dependência militar da UE e impacto das ameaças de Trump. Eurodeputada é favorável a um instrumento de dívida comum para reforçar autonomia europeia em defesa e segurança.

Ouço-os e procuro conter-me!

Quando olho,
- para os sucessivos Presidentes da República na sua (por inerência) qualidade de Comandante Supremo das Forças Armadas (CSFA), em que o actual para mim não passa de um básico CSFA (comandante superficial das forças armadas),
- para os sucessivos PM e ministros da chamada Defesa Nacional (nada disso foram/ são, não passaram /passam de uns tristes ministros da tropa),
- para vários dos sucessivos chefes militares pós 1976,

encontro as explicações para o estado actual do país e designadamente das FA.

Desde 1976, mas particularmente desde 1982, a esmagadora maioria dos titulares de órgãos de soberania, a esmagadora maioria dos políticos, pensadores, comentadores, academia, instilaram nos portugueses que defesa nacional = FA. Nada mais errado.

As FA constituem, TÃO SÓ, o pilar militar da defesa nacional, para que concorrem designadamente, a diplomacia, a economia, etc.

Este entrevistado alinha, como muito outros, no massacre em curso desde que o fdp do Putin se atirou à Ucrânia.

Todos a querer compras de material, particularmente americano.
Gastar mais dinheiro, sem equacionar seriamente as questões nacionais.
As questões sociais, desemprego, desarticulação do tecido social, desordenamento territorial, desindustrialização de há anos, e de que agora as consequências desabam no presente. 
Agora queixam-se. 

Parece-me óbvio que, para Trump, uma das vertentes do MAGA passará por melhorar a balança comercial nomeadamente com impulso no complexo militar industrial através de fortes compras Europeias e de outros países aos (seus) 
sectores da defesa e do armamento americanos.

Marcelo diz que ele é um óptimo comerciante.
Haja paciência democrática para aturar Trump e Marcelo.

Quanto ao entrevistado, melhor, pois não perco tempo com o entrevistado, quanto ao assunto a que chamo o "massacre", decidi-me olhar para ele e vou voltar a começar a escrever umas linhas, a pouco e pouco. Como no passado. 
A propósito, se calhar irão aparecer alguns a confortar-me em público, a dizer que tenho bastante razão, que estou muito prolixo, etc., mas quanto a eles . . . . 

Não tenho direito a escrever, porventura, umas quantas asneiras e, talvez, no meio delas, duas ou três coisas razoáveis e porventura certeiras?

(continua)

AC

Sem comentários:

Enviar um comentário