19 MAIO - Recordações.
Hoje, 19 de Maio, pelas 2340 horas, fará 46 anos que, quando o meu navio (onde cumpria a minha comissão no então Ultramar) navegava em ocultação total de luzes e em postos de combate/bordadas, fui/ fomos atacámos por bombordo no rio Cacheu, na Guiné, hoje Guiné-Bissau.
Como outros, que estávamos no exterior do navio, como quase todos menos um, tive muita sorte. Estava uma noite de espectacular luar.
Morreu um comando africano, dos muitos que transportávamos no exterior do navio, junto a quem rebentou o primeiro e único projéctil/ granada lançado pelos então guerrilheiros do PAIGC. Houve feridos, um incêndio, e o navio teve danos vários, inclusive um rombo abaixo da linha de água.
Passadas semanas, um relatório da PIDE/DGS, confirmou a morte de todo o grupo de guerrilheiros atacantes.
Não era de esperar o contrário, pois tinham que infiltrar-se pelas densas árvores até ao rio, e ainda que sem serem vistos de bordo, a reação de fogo do navio e de todo o pessoal armado que estava no exterior (se bem recordo, mais de 8 dezenas) e que terá durado para aí um minuto no máximo, varreu com aço literalmente toda a zona. Como se viu no local na manhã seguinte ao ataque, uma zona enorme quase circular de árvores zurzidas, sem folhagem, sem ramos pequenos, sem casca. Tudo branco. O tempo voa, 46 anos!
Eu não esqueço.
E recordo, com emoção, todos os que estavam comigo, e que nunca mais encontrei. Recordo, também, todos os que connosco conviveram naquelas paragens Africanas, de 29 de Outubro de 1971 a 28 de Julho de 1973.
Andam para aí muitos que não esquecem nada, porque quase nada ou mesmo nada sabem. Esquecem-se apenas da participação nas pouca vergonhas que hoje se desabam em cima de nós, activa nuns casos passiva em outros.
Mas sobretudo não sabem respeitar, o passado, a história, os combatentes, os que morreram.
Não respeitam os que como eu andaram na guerra e que felizmente regressaram quase sem sequelas. QUASE. O ouvido esquerdo nunca mais foi o mesmo, como se vê nos audiogramas.
Mas acima de tudo não respeitam os milhares de portugueses que regressaram de África com sequelas mas sobretudo os familiares daqueles que tombaram pela Pátria. Esquecem além disso, o que a CRP estabelece, e o que está em letra de lei na legislação que enquadra a Defesa Nacional e a sua componente militar.
Dever de tutela, respeito pela lei, verticalidade, honestidade intelectual, respeito pela história do País, estes e outros valores são lixo para a “gentinha” que desgraça o País.
Os tempos são outros, a realidade do País é diferente, as missões, os meios designadamente os recursos humanos, têm que se conformar ás realidades do presente, mas devendo olhar e acautelar o futuro.
Foi há 46 anos, foi outro dia!!
António Cabral